Ode à cebola


Cebola,
luminosa redoma,
pétala a pétala
se formou a tua formosura,
escamas de cristal te acrescentaram
e no segredo da terra escura
se arredondou o teu ventre de orvalho.
Sob a terra
foi o milagre
e quando apareceu
o teu torpe talo verde,
e nasceram
as tuas folhas como espadas no quintal,
a terra acumulou o seu poderio
mostrando a tua nua transparência,
e como em Afrodite o mar remoto
duplicou a magnólia
levantando os teus seios,
a terra
assim te fez,
cebola,
clara como um planeta,
e destinada
a reluzir,
constelação constante,
redonda rosa de água,
sobre
a mesa
das pobres gentes.

Generosa
desfazes
o teu globo de frescura
na consumação
fervente da panela,
e a tira de cristal
ao calor aceso do azeite
se transforma em encrespada pena de ouro.

Também recordarei como fecunda
a tua influência o amor da salada,
e parece que o céu contribui
te dando a fina forma de granizo
celebrando a tua claridade picada
sobre os hemisférios de um tomate.

Mas ao alcance
das mãos do povo,
regada com azeite,
pulverizada
com um pouco de sal,
matas a fome
do peão no duro caminho.

Estrela dos pobres,
fada madrinha
embrulhada
em delicado
papel, sais do solo,
eterna, intacta, pura
como semente de astro,
e ao te cortar
a faca na cozinha
sobe a única lágrima
sem dor.
Fizeste-nos chorar sem nos afligir.
Tudo quanto existe celebrei, cebola;
mas para mim és
mais formosa que uma ave
de penas cegadoras,
és para os meus olhos
globo celeste, taça de platina,
dança imóvel
de anêmona nevada
e vive a fragrância da terra
na tua natureza cristalina.

(Pablo Neruda – 1954)