CARTA ABERTA DOS MÚSICOS "MENOS CONHECIDOS E DECADENTES" À EXMA. SRA. MINISTRA DA CULTURA MARTA SUPLICY.
Exma. Sra. Ministra da Cultura Marta Suplicy,
Nós, os músicos menos famosos, os
desconhecidos, os decadentes, nos sentimos muito "tocados" com seu
depoimento no jornal O Globo. Sim, temos muitas reclamações, a respeito do
ECAD, da OMB, das políticas de incentivo à cultura, das rádios, das emissoras
de televisão, do Jabá (que existe, e saiba, não por mérito nosso), da missão
quase impossível de se viver de arte e cultura no nosso país.
Nos sentimos tocados pela falta de
sensibilidade da Sra. Ministra diante de um país inteiro, repleto de GRANDES,
DESCONHECIDOS E DECADENTES ARTISTAS, sim, pois para um artista, o que atesta a
sua envergadura não é a fama, embora a Sra. Ministra acredite no contrário.
Um artista vive porque sua arte é essencial,
vital...
Um artista vive pois há um mundo de sabores, dores, alegrias, emoções de todas
as cores a explodir dentro do peito tornando insuportável a vida longe do
palco...
Um artista vive porque nasce com um nó na garganta, que aperta mais e mais a
cada dia de silêncio...
Um artista vive porque há por todo o mundo uma infinidade de cantos para se
cantar, danças para se dançar, formas para se esculpir, imagens para se pintar,
palavras para se escrever, idéias e ideais para se cumprir...
Um artista vive porque não há escolha, um artista não é artista porque quer, um
artista é artista porque precisa.
Um artista vive pelo momento mágico do aplauso, da lágrima furtiva do público,
do sorriso...
Um artista vive com tanto e tão pouco, pois o tanto pode ser apenas uma única
pessoa tocada pelo seu fazer artístico.
Um artista vive pela necessidade de compartilhar sua vida com quem quer que
esteja disposto a ouvir.
Um artista vive com a sensação de há sempre algo que ainda não foi dito.
Um artista vive por insistência única e imprescindível de ser sincero aos seus
sentimentos, às suas emoções.
Um artista vive por teimosia...
Um artista vive dilacerado pela dor de não conseguir sobreviver da sua arte.
Um artista vive momentos de dúvida, de desespero e descrédito em si mesmo
enquanto o tempo passa e as contas se acumulam...
Um artista vive sempre a se reinventar, a acreditar no novo, a buscar o passado
para visualizar o futuro.
Um artista vive com a sensação de total desamparo diante de um país que esquece
seus grandes artistas sejam eles famosos ou não.
Um artista vive a fazer planos, projetos, buscar apoios, patrocínios que nem
sempre chegam ou dão conta do mínimo necessário para realizar o seu sonho.
Um artista vive dos seus sonhos, tornados realidade... ou não...
Um artista vive muitas vezes como pária, um marginal de uma sociedade de
clones, de carimbos desprovidos de individualidade.
Um artista vive como o o último soldado a abandonar o campo de batalha, porque
Sra. Ministra, embora a senhora não seja atingida, nós estamos no meio do fogo
cruzado, nós somos o soldado que se mantém de pé e luta até a última gota de
sangue, mesmo que a batalha pareça perdida... E enquanto houver um artista fiel
aos seus ideais e sua voz se fizer ouvir em algum canto por quem quer que seja
e uma nova emoção brotar desse encontro, a arte cumprirá a sua função de unir
os homens. E é isso, Exma. Sra Ministra da Cultura Marta Suplicy, é isso que
faz de um artista desconhecido, decadente, um artista verdadeiramente GRANDE.
Respeitosamente,
Eduarda Fadini - cantora, atriz, poeta,
ARTISTA...