A angústia


Existe um brado proclamado pelos filhos de Core, no Salmo 46, afirmando que Deus é um refúgio, uma fortaleza e um socorro presente no dia da angústia.

Entendo que a angústia não está limitada a um lugar, tampouco a um tempo específico, mas é um estado de grande aflição, uma ansiedade opressora que gera tristeza e agonia em que a sofre, podendo ocorrer em qualquer momento, sem respeitar nossas agendas e programas.

Aliás, na caminhada da fé, à medida que andamos no rumo da busca da perfeita vontade do Criador, a santificação inicia em nós um processo agonizante de metamorfose, confrontando severamente nossos padrões morais, éticos e espirituais.

Na minha ambição pessoal em ser um “homem de Deus”, quando um sinistro acontece me impedindo de cumprir com um compromisso financeiro, por exemplo, logo me angustio e o pavor de ver minha honra manchada por um comentário contra minha boa fama toma conta de mim.

No meu caso, concluí que os motivos que mais têm influência sobre a estabilidade de minhas emoções giram sempre em torno de minhas preocupações, conceitos e códigos de honra individuais, tais como minhas necessidades de marido, pai e provedor.

Estou entendendo que o processo que me conduz a Deus, dia a dia, é semelhante a um ritual permanente de entrega – morte – ressurreição que me joga na mais funda cova e logo após, me arremessa a mais elevada glória preparada por Deus para mim.

O apóstolo Paulo salmodia que por amor a Deus morremos todos os dias!

Isso me leva a uma questão crucial: se morro todos os dias, então, preciso provar da ressurreição também todos os dias.

Aprender sobre a angústia da minha alma e sobre os meus medos tem me feito entender aquilo que me faz morrer para mim mesmo, me ajudando a reconhecer onde está a Cruz que Ele determina que eu carregue, pois um fato está patente aos meus olhos: se sem fé é impossível agradar a Deus, sem morte é impossível encontrar a sua ressurreição.

Cantamos que pai Abraão tem muitos filhos, que eu sou um deles e que você também é, mas, a Bíblia esclarece que em Isaque, foi chamada a descendência prometida. Por quê?

Porque Isaque foi o filho que encarou a morte!

Se entrarmos no clima que cercou a jornada de sacrifício de Abraão até o monte Moriá vamos fatalmente concluir que um estado tomou conta de seu coração naquele evento: a angústia.

Somos semelhança de Deus, e entendo que Ele é uma pessoa emocional. A Bíblia citou nosso Deus com raiva, com alegria, triste, arrependido. Se Ele é assim mesmo, ao tentar imaginar seu sentimento diante do sofrimento de seu Filho na Terra, certamente identificaremos de novo o estado de angústia.

Pensando sincera e dolorosamente sobre isso, tem me parecido que o estado de angústia enreda nossas almas em momentos relacionados à morte. Retomando o princípio proposto nesta reflexão, de que é preciso morrer para ressuscitar, instruiria a cada crente a encarar suas aflições como verdadeiras ferramentas de aperfeiçoamento de nossa humanidade, aniquilando nossas obscuridades pessoais e egoístas, trazendo à tona uma vida espiritual mais excelente, oculta dentro dos labirintos da nossa psique.

Ocorre, contudo, que como qualquer ser humano nascido e criado numa era filosófica e espiritualmente tão afeiçoada às próprias causas e necessidades, todos nós temos pavor da morte e aversão à dor, ou a qualquer coisa que não seja o nosso próprio bem estar. Quando alguma situação desconfortável passa a nos conduzir para o estado de angústia, ao invés de buscarmos o verdadeiro, mas doloroso tratamento que conduz a plena cura, iniciamos um processo de busca de elementos que amenizem nosso sofrimento, tal como se procura por um tratamento paliativo que oferece um alívio momentâneo a uma doença grave.

As mesmas situações que me levaram a procura de sensações momentâneas de prazer em drogas, álcool, sexo, comida em excesso, se davam por minha constante necessidade de fugir da angústia, que simboliza a minha morte.

Nossa geração tem criado personalidades frouxas diante desse fundamental tratamento divino que visa o estabelecimento de verdadeiros homens e mulheres de Deus, capazes de tomar sua Cruz e apresentar ao mundo perdido a verdadeira e gloriosa face de Deus.

Hábitos maníaco-compulsivos que acabam se manifestando nas mais diversas áreas da vida privada do indivíduo - em alguns casos se tornando terríveis patologias – podem ser o resultado dessa postura de fuga diante do inevitável momento da morte do “eu” de cada cristão.

Por fim, podemos absorver a clara compreensão desse tratamento de Deus na vida de Paulo, quando o mesmo afirmava que sentia prazer na angústia, pois via que a mesma aperfeiçoava o poder de Cristo em si.

Tomar a Cruz, negar-se a si mesmo e ter prazer nas aflições, são figuras de linguagem bíblicas para o que poderíamos chamar simplesmente de encarar a angústia, ser corajoso a ponto de não temer a morte de seu ego e passar a enfrentar situações desconfortáveis para si mesmo. Talvez a sua humilhação pública promovida pela difamação, a perseguição de seu ministério e chamado por parte de gente que parecia ser seu amigo, ou ainda, a vergonha de ter que depender de alguém, um parente, um amigo ou um chefe para pagar uma conta, enfim, coisas que nos quebrantam, tudo isso poderá ser o instrumento divino para aperfeiçoar a pessoa de Jesus que está dentro de você.

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